quinta-feira, 3 de maio de 2012

Casos de Polícia.

Não raras vezes sou indagado por amigos(as) sobre a minha profissão, o que acontece dentro de uma Delegacia, se tem muita baixaria, que tipo de crimes acontecem mais, se tem coisas extraordinárias, se é perigoso, enfim, como é o dia-a-dia na DP. A primeira coisa que respondo é que para ser policial tem que ter vocação, porque não é fácil ficar dentro de um ambiente pesado como esse só pensando no salário que vai receber no final do mês. Acho que é uma espécie de funcionário público que não tem como enrolar, porque, aqui, dependendo você pode não receber no final do mês, simplesmente por não ter sobrevivido até o final do mês. É trágico, mas a profissão te cobra estar sempre cem por cento ligado.
Sem fazer drama, vamos aos fatos. Em uma delegacia há todo tipo de pessoa que vai ali. Existem os que realmente foram vítimas de qualquer espécie de crime, há os que vão ali para ter um papel nas mãos que vão lhe dar a falsa segurança de estarem protegidos (a ocorrência para essas pessoas é como se fosse um escudo do Capitão América), os que pensam que ali é o lugar para resolver qualquer problema, mas qualquer problema mesmo, os que vão ali para escutar um conselho (isso tem demais), enfim, tem para todo gosto. Vou citar alguns nas próximas linhas.
Nos meus primeiros dias de trabalho estava conversando com uma colega quando fui abordado por uma senhora, já com seus setenta anos, com cara de brava, tipicamente uma Cearense, digo isso porque sou filho de um, que me chamou e disse que queira registrar uma ocorrência contra outra mulher. Eu perguntei qual era o problema ao que fui surpreendido com o seguinte caso. O que passo a dizer agora é a mais pura verdade e tenho testemunha disso: “meu filho é o seguinte, eu sou do Ceará e já moro aqui em Brasília há muitos anos. Eu sofro muito com uma antiga vizinha minha de lá que desde que eu mudei para cá nunca mais me deixou em paz”. Eu perguntei o que era, e vejam só o que ela me disse: “o negócio é que essa mulher é macumbeira e ele fez um “serviço” para mim. Ela tem uma máquina no quintal da casa dela, que toda vez que ela aperta o botão dessa máquina, na hora me dá uma dor de barriga dos infernos. Eu já não agüento mais passar tanto desconforto, são muitos anos sofrendo com essa dor de barriga, tem dia que só falta eu fazer minhas necessidades na roupa, vocês têm que fazer alguma coisa para acabar com isso”. Eu e minha colega não sabíamos o que fazer, pensa em dois novinhos de profissão diante de um caso desses. Rir? Jamais! Mas, com muita calma e na mais absoluta educação eu disse a essa Senhora que essa ocorrência só poderia ser registrada no Ceará, porque o local do fato era a Terra do Sol Nascente (óbvio que disse Ceará). Ao que ela deixou a Delegacia satisfeita com a resposta e disse que quando voltasse ao Ceará iria na Delegacia para os policiais de lá destruírem a máquina de sua vizinha macumbeira.
Outro caso típico era o de pessoas que iam fazer programa com travestis e eram surpreendidos pelos mesmos. Havia uma resposta padrão que sempre era dita. Os caras chegavam à delegacia dizendo que haviam sido assaltados por um travesti e ao perguntarmos como havia sido o caso eles davam essa resposta: “eu estava passando aqui próximo da delegacia com o vidro aberto do meu carro e de repente ele pulou dentro do meu veículo e me assaltou com uma faca”. O fato em si até que não é tão estranho, mas era impressionante o número de pessoas que sempre davam essa resposta. O travesti pulava dentro do carro deles. Algumas vezes desconfiados de tais repostas íamos atrás dos travestis e ao levar os mesmos para a DP lá começava uma baixaria sem fim. A resposta dos travestis? “Ele queria que eu fizesse sexo oral nele e no final não me pagou”. Aí era enredo de novela das oito. Um dizendo que era mentira e o outro dizendo que era verdade. O certo é que na maioria das vezes a vítima não queria mais registrar a ocorrência porque não queria ver seu nome ligado a um roubo com travesti. O motivo? Eram casados e moravam no Plano Piloto. Como justificar que estavam na Ceilândia de madrugada e envolvido em ocorrência com travesti? Complicado... O problema é que ao tomarmos conhecimento do fato éramos obrigados a registrar a ocorrência, afinal, tratava-se de crime grave, roubo, e aí, a vítima ficava sem saída.
Conto do bilhete premiado. Você acha que isso não existe mais? Certa vez registrei uma ocorrência onde uma senhora foi ludibriada por um estelionatário aplicando este golpe tendo conseguido levar dela quatro mil reais. Ele fingindo ter um bilhete milionário nas mãos falando para uma senhora que iria rachar o dinheiro com ela acabou aplicando-lhe um golpe e a mulher ficou sem o dinheiro. Ela me disse ainda que o pior era chegar em casa e explicar para o marido o que havia acontecido. Por incrível que parece esse tipo de crime ainda é muito aplicado. Um outro golpe é deixar um envelope cheio de cheques cair no chão, uma pessoa ver e devolver o envelope e o dono oferecer uma recompensa. Só que para receber o dinheiro a pessoa tem que deixar a sua bolsa com outra pessoa enquanto ele vai pegar a grana. Enquanto a pessoa espera receber o dinheirinho, o suposto dono do cheque vai embora, a pessoa que estava com a bolsa vai embora e a recompensa é um boletim de ocorrência na DP. O detalhe é que os cheques são falsos, e o estelionatário sempre age em conluio com terceiros.
O golpe do celular onde a pessoa recebe uma ligação falando que um parente seu foi seqüestrado e que quer como pagamento de recompensa trezentos reais em crédito de telefone também acontece muito. Mensagens que chegam falando que você ganhou uma casa do Silvio Santos também aparecem aos montes, e que para a pessoa receber a casa basta depositar certa quantia que a papelada logo sai. São golpes que você acha que só têm nas novelas, mas, infelizmente na vida real existem e levam dinheiro de muita gente inocente e a maioria é pobre que não tem informação nenhuma.
Uma vez de madrugada eu estava no balcão da delegacia quando ali chegou uma pessoa andando corcunda e com a mão na barriga. Perguntei o que houve e ela me disse: “acabei de levar um tiro e queria fazer uma ocorrência!!!” Eu não acreditei naquilo. O cara acabara de ser alvejado e queria um papel ao invés de estar em um hospital se tratando. É impressionante o número de pessoas que acham uma ocorrência mais importante que qualquer outra coisa. Nesse caso levamos a pessoa para o hospital para ser tratada e fizemos as diligências preliminares sobre o fato. Depois descobrimos o porque ele queria a ocorrência.
São muitos os casos que ocorrem dentro de uma Delegacia de Polícia. Alguns engraçados, mas a maioria triste e alguns revoltantes. Infelizmente a criminalidade cresce a cada dia, esses malditos filhos da puta parecem que brotam do chão, e nosso trabalho às vezes parece que não rende. Sou a favor de uma mudança brusca em nossa Legislação Penal ou chegará a um ponto onde a bandidagem vai agir tão livremente que uma guerra civil poderá eclodir. A Polícia muitas vezes é injustiçada, mas vocês não sabem o quanto é duro enfrentar a escória para a população ter um mínimo de segurança possível. Somos pagos para isso sim, mas acho que nosso trabalho deveria ser mais recompensado e não digo pelo lado financeiro não, mas pelo fato de ver o nosso trabalho render. Se prendemos um cara com dezoito assaltos nas costas no outro dia ele não pode estar solto. Isso é covardia com a população.
Infelizmente quem faz a lei não está muito preocupado com o povo, mas sim com o bandido...
Direitos humanos existem para o vagabundo, para o homem de bem existe a Fé e a esperança...

Um abraço pessoal...

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